quinta-feira, 24 de março de 2011

Fragmento do primeiro capítulo de O Ateneu – Raul Pompéia


(...) Poema intencionalmente moral é o mesmo que estátua polícroma, ou pintura em relevo. Apenas uma coisa possível, nada mais; há também quem faça flores, com asas de barata e pernas.
A verdadeira arte, a arte natural, não conhece moralidade. Existe para o indivíduo sem atender à existência de outro indivíduo. Pode ser obscena na opinião da moralidade: Leda; pode ser cruel; Roma em chamas, que espetáculo!
Basta que seja artística. (...)
O meu bom amigo, exagerado em mostrar-se melhor, sempre receoso de importunar-me com uma manifestação mais viva, inventava cada dia nova surpresa e agrado. Chegava ao excesso das flores. A princípio, pétalas de magnólia seca com uma data e uma assinatura, que eu encontrava entre as folhas de compêndio. As pétalas começaram a aparecer mais frescas e mais vezes; vieram as flores completas. Um dia, abrindo pela manhã a estante numerada do salão do estudo, achei a imprudência de um ramalhete. Santa Rosália da minha parte nunca tivera um assim. Que devia fazer uma namorada? Acariciei as flores, muito agradecido, e escondi-as antes que vissem. (...)
Não denunciar nunca é preceito sagrado de lealdade no colégio. os contentores recusaram-se a explicações. Bento Alves negou o braço a exame e curativo; Malheiro, em panos de sal, fingindo-se muito prostrado, oferecia o mais impenetrável silêncio às indagações de Aristarco e protestava esborrachar as ventas a quem caísse na asneira de insinuar o bedelho no que não era de sua conta. 




Referencia do texto:
http://www.graudez.com.br/literatura/realismonaturalismo.html

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